A homoparentalidade vivenciada em diferentes contextos: um estudo com famílias brasileiras e portuguesas

Nome: CAROLINA MONTEIRO BIASUTTI
Tipo: Tese de doutorado
Data de publicação: 31/03/2023
Orientador:

Nomeordem decrescente Papel
CÉLIA REGINA RANGEL NASCIMENTO Orientador
VALESCHKA MARTINS GUERRA Co-orientador

Banca:

Nomeordem decrescente Papel
ALESSANDRA BRUNORO MOTTA LOSS Examinador Interno
ALINE NOGUEIRA DE LIRA Examinador Externo
CÉLIA REGINA RANGEL NASCIMENTO Orientador
PAULA ALEXANDRA CRUZ DA SILVA XAVIER Examinador Externo
POLLYANA DE LUCENA MOREIRA Suplente Interno

Páginas

Resumo: Esta pesquisa teve como objetivo conhecer e descrever, do ponto de vista do adulto, a vivência da parentalidade exercida por casais do mesmo sexo em dois diferentes contextos, no Brasil e em Portugal, considerando os fatores promotores de desenvolvimento para a Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano (TBDH). Tal teoria sustenta que é no microssistema familiar que o indivíduo estabelece suas primeiras relações significativas e é através de interações recíprocas, frequentes e contínuas, chamadas processos proximais, que o indivíduo se desenvolve. Assim, na parentalidade, os processos proximais estabelecidos entre os adultos e as crianças promovem o desenvolvimento de ambos. Para essa teoria, entre outros fatores, o macrossistema, contexto no qual valores, cultura e crenças estão presentes, influencia a ocorrência dos processos proximais. Portanto, é relevante estudar como a parentalidade se organiza e é vivenciada em diferentes contextos. Com o intuito de abarcar os objetivos propostos, esta pesquisa foi composta por dois estudos. O primeiro estudo tratou-se de uma revisão integrativa que objetivou analisar e sistematizar o conhecimento produzido sobre a
parentalidade por casais do mesmo sexo nos contextos brasileiro e português até o ano de 2019. Buscou-se descrever os principais temas abordados na produção científica, em artigos empíricos nos dois países e destacar avanços e/ou lacunas nas discussões. As bases pesquisadas foram: LILACS, Redalyc, RCAAP, PePSIC, SciELO e EBSCOhost. As buscas aconteceram em 2020, com total de sete descritores em português e suas respectivas traduções para o inglês, resultando em 17 diferentes combinações de busca. Foram recuperados 53 artigos: 35 brasileiros, 17 portugueses e 1 luso-brasileiro. Padrões na produção científica sobre o tema foram observados, e o material foi analisado qualitativamente por meio da Análise Temática. Todos os artigos selecionados apresentaram delineamento transversal, com prevalência de estudos qualitativos no Brasil e quantitativos em Portugal. O primeiro eixo temático organizou extratos sobre as Concepções de outros grupos sobre aspectos que envolvem a homoparentalidade, organizados em dois subtemas: Concepções de diferentes grupos sobre a homoparentalidade; e Concepções de outros grupos sobre o desenvolvimento da criança na família homoparental. O segundo eixo temático reuniu excertos sobre as Vivências das famílias
de pessoas lésbicas/gays/bissexuais (LGB), com e sem filhos, organizados em cinco subtemas: Desejo, projeto, e via escolhida para concretização da parentalidade; Vivências associadas à parentalidade nas famílias LGB com filhos; Importância dos aspectos legais/jurídicos; Relação das famílias com diferentes contextos: Suporte X Preconceito; e Modos de enfrentamento.
Verificou-se, nos dois países, o desejo, a concretização e a vivência da parentalidade, os desafios enfrentados pelas famílias e as práticas parentais exercidas com as crianças, bem como o baixo apoio social e o enfrentamento de preconceitos relacionados à lgbfobia. Embora as concepções acerca da parentalidade exercida por casais do mesmo sexo e os seus benefícios
para o desenvolvimento infantil tenham sido positivas para uma larga parcela da população brasileira e portuguesa, concepções negativas foram muito presentes nos dois países, sobretudo entre pessoas mais velhas, homens, religiosos e mais conservadores. O segundo estudo parte de uma perspectiva qualitativa, com o objetivo de investigar, da perspectiva das mães, as
interações entre mães e filhos/filhas, analisando as experiências vivenciadas pelas mulheres, em famílias formadas por casais do mesmo sexo, no micro, meso, exo e macrosssitema, a partir dos fatores promotores do desenvolvimento do modelo Pessoa-Processo-Contexto-Tempo, da TBDH e da resiliência familiar. Mais especificamente, objetivou-se conhecer e descrever a
vivência da parentalidade e as interações estabelecidas nessas famílias, por meio das práticas parentais e interações entre mães-crianças em famílias de casais do mesmo sexo no contexto brasileiro e no contexto português; identificar a avaliação das participantes quanto a sua inserção em diferentes contextos, como escola, família extensa e sociedade no geral, bem como
os desafios e enfrentamentos presentes nessas interações; e conhecer como as participantes compreendem o ajustamento de suas famílias às questões socioculturais do país em que habitam, identificando relações entre micro e macrossistemas. Participaram deste estudo nove mulheres brasileiras e oito mulheres portuguesas, membros de cinco famílias brasileiras e cinco
famílias portuguesas, com filhos/filhas com idade igual ou menor a nove anos, inseridos no contexto escolar/creche e que exerciam a parentalidade em conjunto com a parceira desde o nascimento das crianças. O instrumento utilizado para a coleta de dados foi um roteiro de entrevista semiestruturado, aplicado individualmente, construído para a investigação com base
na Teria Bioecológica e nos fenômenos de interesse. As informações coletadas foram transcritas integralmente e analisadas qualitativamente com a proposta da Análise Temática. O material foi organizado e analisado, a partir de quatro principais eixos temáticos: 1) Processos proximais e interações no microssistema familiar; 2) Mesossistema: Interação do microssistema familiar
com os microssistemas famílias de origem e com a escola das crianças; 3) A vivência e compreensão sobre a homoparentalidade no contexto social mais amplo; 4) Repercussões do Macrossistema: Reflexões sobre a heteronormatividade e o acolhimento social da diversidade das famílias. Verificou-se que, através de processos proximais, identificados em interações
engajadas e frequentes, as participantes descreveram o fortalecimento e a complexificação das interações parento-filiais, ampliando recursos, habilidades e competências parentais ao longo do tempo, que contribuíram para o desenvolvimento de mães e crianças em interação.
Verificou-se, a partir do projeto parental, o desenvolvimento de novas competências, ajustes na relação entre o casal, mudanças na rotina e divisão de tarefas, além de investimento afetivo nas interações e práticas de cuidado com as crianças. Esses resultados apontam para a qualidade das interações e dos processos proximais estabelecidos entre mães/crianças no microssistema
familiar. Identificaram-se, de acordo com modelo de parentalidade de Hoghughi, características e habilidades referentes ao grupo dos pré-requisitos (motivação; conhecimento e compreensão; recursos; e oportunidade) e atividades parentais que correspondiam às dimensões de cuidado
(físico, emocional e social), controle e desenvolvimento, atendendo às necessidades básicas infantis, promovendo o bem-estar infantil e a prevenção de adversidades. Identificou-se que a maior parte dos desafios vivenciados estavam relacionados às interações sociais em outros contextos, com ênfase nos processos proximais inversos vivenciados tanto pelas crianças, no
ambiente escolar, tanto pelas participantes, sobretudo nas famílias de origem. Verificou-se que políticas e atitudes macrossociais influenciavam as atitudes e interações com pessoas em contextos mais proximais. Uma diferença pronunciada entre os dois países se referiu ao clima político brasileiro, que potencializou a ocorrência de expressões de preconceito nos micros,
meso, exo e macrossistema e impactou o bem-estar das participantes. Identificou-se o processo de politização das participantes sobre a cultura heteronormativa e a conscientização sobre os processos do estresse minoritário que impactavam o bem-estar familiar, e a utilização de
recursos e estratégias de enfrentamento pelos membros familiares. Os processos de lgbfobia vivenciados nos microssistemas em que as participantes estavam ou estiveram inseridas tiveram maior impacto sobre o bem-estar individual e familiar, como o bullying ocorrido no ambiente escolar e a lgbfobia vivenciada no microssistema da família de origem. Frente à construção do
projeto parental iniciado em conjunto, concluiu-se que as famílias apresentavam processos proximais parento-filiais estáveis, engajados e frequentes, bidirecionais, motivação e empenho no estabelecimento de comportamentos adequados às necessidades infantis, e indicadores de
processos de resiliência familiar, prosperando, apesar das adversidades e vulnerabilidades vivenciadas.
Palavras-chave: parentalidade; famílias; famílias de minorias sexuais; minorias sexuais; cultura; Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano.

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